Texto 1

O que seria do aluno sem o professor

Desconhecido, publicado originalmente no site da Rádio CBN

Num dia ensolarado o coelho saiu de sua toca com seu laptop a tiracolo (fábula moderna) e pôs-se a trabalhar, bem concentrado.
Pouco depois passou por ali uma raposa e viu aquele suculento coelho, tão distraído. Salivando, foi se aproximando do coelho, se aproximando, com suas presas à mostras, pronta para o bote e… e estranhou que o coelho não desgrudava os olhos do computadorzinho. Ficou intrigada.
-Coelho, o que você está fazendo aí, tão concentrado?
-Estou redigindo a minha tese de doutorado – disse o coelho sem tirar os olhos do trabalho.
-Humm .. . e qual é o tema da sua tese?
-Ah, é uma teoria provando que os coelhos são os verdadeiros predadores naturais de animais como as raposas.
A raposa fica indignada:
-Ora! Isso é ridículo! Nós é que somos predadores dos coelhos!
-Absolutamente! Vamos até minha toca que eu mostro a minha prova experimental.
O coelho e a raposa entram na toca. Pouco depois ouvem-se ruídos indecifráveis, sons de luta e corrida, alguns poucos grunhidos. Aí, silêncio absoluto.
Movimento na saída da toca. É o coelho que emerge, sozinho, e mais uma vez abre seu laptop e volta a trabalhar em sua tese como se nada tivesse acontecido.

Mais perigos – Meia hora depois passa um lobo. Ao ver o apetitoso coelho tão distraído agradece mentalmente a cadeia alimentar pelo jantar garantido. No entanto, o lobo também acha muito curioso um coelho trabalhando naquela concentração toda. O lobo então resolve saber do que se trata aquilo, antes de devorar o leporídeo (leporídeo. O que a gente faz para não repetir a palavra “coelho”, meu Deus!):

-Olá, jovem coelho. O que o faz trabalhar tão arduamente?
-Minha tese de doutorado, compadre lobo. É uma teoria que venho desenvolvendo há algum tempo e que prova que nós, lagomorfos (lagomorfo também é bão), somos os grandes predadores naturais de vários animais carnívoros, inclusive dos lobos.
O lobo não se contém e farfalha de risos com a petulância do coelho.
– Ah, ah, ah, ah!! Coelhinho, apetitoso coelhinho. Isto é um despropósito. Nós, os lobos, é que somos os genuínos predadores naturais da sua espécie. Por falar nisso, chega de conversa – disse o lobo, agarrando as orelhas do número 10 do jogo do bicho.
-Desculpe-me, compadre lobo, mas se você quiser eu posso apresentar a minha prova experimental. Você gostaria de acompanhar-me à minha toca?
Ambos desaparecem toca adentro. Silêncio, seguido de uivos desesperados, ruídos de mastigação e … mais silêncio.
Mais uma vez o coelho retorna sozinho, impassível, e volta ao trabalho de redação da sua tese, como se nada tivesse acontecido.

Dentro da toca do pequeno mamífero de longas orelhas vê-se uma enorme pilha de ossos ensangüentados e pelancas de diversas raposas, lobos e aparentados. Apoiado na pilha está um enorme leão, satisfeito, bem alimentado e sonolento, a palitar os dentes.

MORAL DA HISTÓRIA:
Não importa quão absurdo é o tema de sua tese. Não importa se você não tem o mínimo fundamento científico. Não importa se os seus experimentos nunca cheguem a provar sua teoria. Não importa nem mesmo se suas idéias vão contra o mais óbvio dos conceitos lógicos . O que importa é quem é o seu orientador. Alinhe-se no novo momento, com descortínio, serenidade, equilíbrio, sintonizando-se com as novas diretrizes, mas com a crença de que não basta ser inteligente e moderno – é preciso ser sábio. Vale tanto para seus alunos como para você, em relação aos professores mais antigos.